Segunda-feira, 17 de março de 2014 Imagem: Divulgação O Projeto de Lei (PL) n° 2.126/2011, de iniciativa do Poder Executivo, sobre ...
Segunda-feira, 17 de março de 2014
Imagem: Divulgação
O Projeto de Lei (PL) n° 2.126/2011, de iniciativa do Poder Executivo, sobre o Marco Civil da Internet poderá ser discutido no plenário da Câmara dos Deputados, nesta semana. O texto fala dos direitos, deveres, garantias e princípios para o uso da rede mundial de computadores no país. O mesmo tinha sido retirado da pauta a pedido do governo federal, com o receio de que não fosse aprovado pela Casa devido às rixas entre o Planalto e o Partido Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), cujo líder desta legenda, deputado Eduardo Cunha (RJ), manifestou empenho para derrubar o Projeto.
Apesar de ser o primeiro projeto a falar de fato sobre a internet, está longe ainda para ser considerado realmente um 'marco' no sentido de um grande acontecimento.
Texto do Planalto
O texto enviado pelo Planalto tem 25 artigos. Fala da internet como forma de expressão, de direitos humanos e de inclusão social. Descreve o que é internet, IP (protocolo de internet), entre outros termos usados. Estabelece que os provedores de internet guardem por um ano os registros de seus usuários. O fornecimento de tais dados a autoridades policiais e administrativas estaria condicionado à decisão judicial. O terceiro parágrafo do artigo 11, por exemplo, permite que o pedido dos registros possa ser feito previamente, com prazo máximo de 60 dias para apresentar autorização da Justiça. Inclusive, o provedor poderia armazenar por período superior a navegação dos mesmos.
O texto também fala também em 'qualidade' da conexão à internet e veda a discriminação do tráfego de dados aos clientes. Porém quando se fala nessa tal qualidade, não especifica, por exemplo, que poderia se tratar da velocidade da conexão.
Texto alternativo do deputado Molon
No último dia 12 de fevereiro, o relator do Marco Civil da Internet, deputado Alessandro Molon (PT-RJ), apresentou um texto alternativo, com 32 artigos e outros adendos, aparentemente mais completo. Um dos pontos importantes, até mesmo mais valorizado, é o da neutralidade. Assim como o Projeto inicial veda discriminação do tráfego, o segundo texto fala sobre condutas anticoncorrenciais. Existem várias questões citadas no segundo texto: a aplicação das compras online ao Código de Defesa do Consumidor, a Publicidade digital de forma clara, a indenização por violação de dados etc.
O artigo 12 do texto de Molon, por exemplo, exige que grandes provedores de internet, dependendo de seu faturamento, instalem servidores no país para armazenar os portais e os respectivos dados de navegação.
Outro ponto polêmico é o do artigo 11, de seu texto, que sugere que os provedores armazenem os dados cujas pessoas física ou jurídica sejam brasileiras ou seus sites sejam nacionais, tendo um dos servidores aqui no país.
O artigo 14 do texto de Molon – 11 no do Planalto – inclui o Ministério Público como requerente de dados de navegação. Porém, ambos não especificam o que seriam autoridades administrativas.
Os artigos 14 e 15 do texto original sugerem que os provedores não sejam responsáveis por danos de conteúdos gerados por terceiros, porém que possam retirá-los do ar mediante ordem judicial, respectivamente. Os mesmos tópicos são citados por Molon em seus artigos 19 e 20, respectivamente, ao tentar justificar o impedimento à censura. Tais regras se aplicam a portais que armazenam blogs, sites, redes sociais e vídeos de terceiros, tais como: o Blogspot e o You Tube – do Google –, o Wordpress, Twitter, Facebook, entre outras plataformas.
Molon defende, por exemplo, que a discriminação e/ou regulação do tráfego seja regulamentada por decreto presidencial.
Texto alternativo do deputado Eduardo Cunha
Já o deputado federal Eduardo Cunha (PMDB-RJ) também apresentou uma alternativa ao texto base do Marco Civil da Internet, no dia 18 de fevereiro. Diferente de seu homólogo petista, propõe que fique a cargo da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) a discriminação e/ou regulação do tráfego.
Seu texto tem 30 artigos e aborda a liberdade dos modelos de negócios promovidos pela internet, por exemplo. Outros aspectos são semelhantes aos de Molon e/ou do texto original.
Análise
Todo mundo sabe que o que motivou o Planalto, em especial, a presidenta Dilma Rousseff, a voltar no assunto em torno do texto do Marco Civil da Internet, parado há três anos, foi as denúncias de suposta espionagem por parte da Agência Nacional de Segurança dos Estados Unidos (NSA, na sigla em inglês) ao seu governo e à Petrobras, conforme relatou o ex-analista Edward Snowden. Este se encontra em solo russo desde agosto do ano passado, onde pediu asilo, o qual foi concedido pelo presidente Vladimir Putin.
O texto precisaria de outros projetos de lei adicionados. Pois, como está não atende à necessidade tão enfatizada pelo governo brasileiro: a inviolabilidade de dados. Para começo de conversa, o Projeto não tipifica os crimes de internet. Fala de violação de dados de uma maneira generalizada, além de não fazer menção às formas de uso indevido de informações e suas possíveis punições. Reter dados privados e alheios de forma indevida consiste em invasão de privacidade. Isso deveria ser tão óbvio sem a necessidade de se ressaltar aqui. Invasão a contas bancárias poderia ser enquadrada como uma violação, da mesma forma como invadir contas de e-mail, servidores, redes sociais etc.
Todavia, a expressão 'violação de dados' é subjetiva: quando se acessa determinados sites, estes registram os dados de navegação de seus usuários/leitores, tais como: as páginas visitadas e o IP. É bastante comum no You Tube, o internauta encontrar sugestões de vídeos baseadas em acessos anteriores. Da mesma forma que certos buscadores registram os passos dos usuários. Quem nunca acessou sites de grandes varejistas, por exemplo, em busca de um produto, e depois, ao visitar um blog – que tenha a ferramenta Google Adsense –, visualizar a publicidade daquele mesmo produto??? Antes não aparecia. Vários provedores de e-mails gratuitos possuem ferramentas de propaganda nas caixas postais, e baseadas em temas de interesse dos usuários ou em palavras-chaves de mensagens.
O que dizer, por exemplo, quando um cliente contrata uma banda larga de uma operadora, e logo depois vendedores de outros provedores ficam lhe telefonando para tentar empurrar seus produtos/serviços??? Alguns tentam induzir que sem seus produtos/serviços, sua internet pode não funcionar. Aparentemente, trata-se de um 'vazamento' interno de informações sobre o consumidor. No ano passado, o Ministério Público Federal do Mato Grosso do Sul (MPF-MS) chegou a abrir uma ação civil pública contra essa suposta prática feita pela Oi em relação ao Velox.
Em relação à espionagem, por exemplo, o texto deveria ser mais claro e levar em questão também a colaboração/participação de terceiros (provedores de internet, operadoras de telefonia, agentes públicos, entre outros). Isso não dá nenhuma garantia de que os EUA ou qualquer outro deixarão de 'vigiar' dados do Brasil.
Quanto à tipificação dos crimes de internet, não se menciona, por exemplo, os ataques cibernéticos a sites e/ou a difusão de vírus, tampouco o combate à pirataria em preservação aos direitos autorais. Também não aborda a pedofilia nem a apologia ao preconceito, à violência, ao crime e ao tráfico de drogas por meio da internet, principalmente pelas redes sociais. Quem nunca se deparou com algum perfil promovendo o racismo, a homofobia, a intolerância religiosa ou exibindo pessoas armadas, por exemplo??? Ou então, visualizar em portais de bate-papo usuários se dizendo menores de 18 anos, quando o serviço não é adequado a esse público???
No que diz respeito aos provedores de internet e à conexão, apesar de existir uma norma da Anatel sobre a velocidade mínima, precisaria constar no PL, uma vez que para exigir qualidade tem que especificar. Não é novidade para ninguém que a atuação dessa Agência em relação aos provedores é praticamente nula. Seu controle parece ser mais forte sobre as operadoras de telefonia e as emissoras de rádio, TV e canais a cabo. É fundamental que haja regras claras sobre a contratação, e mais ainda, sobre o cancelamento de produtos e/ou serviços como hospedagem, manutenção de sites, e-mails e registros de domínios de internet. Ao Comitê Gestor de Internet do Brasil – mais conhecido como 'Registro.br' – cabe apenas o registro de endereços nacionais (.br). Tal fiscalização não existe. Quaisquer tipos de reclamações e multas se baseiam no Código de Defesa do Consumidor. Também deveria haver legislação especificando o tempo que um domínio poderia ser reservado ao proprietário em caso de não pagamento de renovação do mesmo. Atualmente, o Registro.br o guarda por três meses após o vencimento da anuidade. Depois desse tempo, o coloca a leilão pelo valor normal de qualquer outro.
Grandes provedores e/ou prestadores de serviços e/ou produtos com representação no Brasil deveriam comercializar na moeda nacional. Um caso atípico é o do Facebook, cuja publicidade é paga em dólar estadunidense e com base nas leis irlandesas.
Outro ponto que tem que ser debatido é o da publicidade eleitoral via internet. Os artigos 57-B e 57-C da Lei Eleitoral (9.504/97) proíbem a propaganda paga. A mesma pode ser gratuita em sites de pessoas físicas, blogs, de partidos e/ou do próprio candidato.
Assim como já acontece na TV, sites também deveriam possuir classificação etária. O intuito é preservar as crianças e os adolescentes de conteúdos chocantes e/ou eróticos.
Apesar da importância de se ter uma legislação específica sobre a internet, isso só é um contorno para que se discuta no futuro o mesmo em torno da TV e dos demais meios de comunicação. Espera-se que essa nova lei não seja apenas uma ferramenta de manipulação para que se possa retirar do ar denúncias e outros materiais de interesse público que comprometam especialmente a classe política.
Mesmo sem uma legislação específica, a prática de censura de conteúdos na web por parte da Justiça brasileira já existe. Em 2012, por exemplo, representantes do Google Brasil chegaram a ser detidos porque a empresa não retirou do You Tube um vídeo sobre um político do Mato Grosso do Sul.
O jornal 'O Estado de São Paulo' está sob censura desde 2009. Uma ordem judicial o proíbe de divulgar detalhes sobre a operação 'Boi Barrica', da Polícia Federal, na qual um dos investigados seria Fernando Sarney, filho do então senador José Sarney (PMDB-AP).
Em setembro de 2011, o grupo RBS, no Rio Grande do Sul, foi vítima de censura por parte do Tribunal de Justiça (TJRS) daquele estado. Não podia divulgar o nome de um vereador que aparecia em um vídeo do 'Fantástico', da TV Globo, sobre o caso conhecido como a 'Farra das Viagens', segundo o site 'Leitura Subjetiva'.
Dados do Comitê de Proteção a Jornalistas (CPJ) revelaram, em 2011, que o Brasil foi o país que mais censurou conteúdos na web no primeiro semestre de 2010, noticiou o 'Leitura Subjetiva'.
Andamento do PL
A Proposta ainda seguirá para análise no Senado. Em caso de sancionada pelo Executivo, entrará em vigor 60 dias após a publicação no Diário Oficial da União.
O portal Avaaz traz uma petição exigindo a votação integral do texto. A mesma é liderada pelo cantor e ex-ministro da Cultura Gilberto Gil e até o momento tem mais de 300 mil assinaturas. “Exigimos que o Marco Civil da Internet no Brasil seja votado de forma integral, preservando os conceitos de neutralidade da rede, liberdade de expressão e a privacidade do usuário de internet brasileiro. Nós exigimos que V. Exas se mantenham firme contra o lobby das empresas de telecomunicações e garantam que nenhum usuário perca seus direitos por causa do lucro de empresas privadas. A internet é livre e precisa continuar dessa forma”, diz o texto.
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