Sábado, 07 de janeiro de 2017 Após novo massacre em Roraima, OAB levará os recentes casos à Corte Interamericana de Direitos Humanos ...
Sábado, 07 de janeiro de 2017
Após novo massacre em Roraima, OAB levará os recentes casos à Corte Interamericana de Direitos Humanos
Facção x facção, o Estado não entra na briga
Imagem: Wilson Dias / Agência Brasil / Reprodução /
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Uma prisão brasileira qualquer superlotada (imagem ilustrativa) |
Na última quarta-feira (4/1), a HRW criticou o banho de sangue amazonense, e declarou que ‘o Brasil precisa tirar das mãos das facções criminosas o controle de suas prisões’.
Foram 60 mortos em dois presídios de Manaus, no Amazonas, entre os dias 1º e 2 deste mês, numa rebelião entre presos das facções Família do Norte (FDN) e do Primeiro Comando da Capital (PCC) que durou mais de 15 horas. Já na madrugada dessa sexta-feira (6), foram mais 31 na Penitenciária Agrícola de Monte Cristo (PAMC), em Boa Vista, Roraima. Os dados preliminares do governo roraimense falavam em 33 óbitos, mas a quantidade foi revista para baixo. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) informou que pretende denunciar os incidentes à Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), para exigir que as autoridades tomem providências para solucionar a crise no sistema carcerário.
O Escritório das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH) disse lamentar mais um episódio do tipo, e cobrou uma investigação ‘imediata, imparcial e efetiva’ dos acontecimentos.
O Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH) afirmou que ‘o Estado brasileiro tem falhado no desenvolvimento de uma política de execução penal em consonância com parâmetros legais nacionais e internacionais e de proteção dos direitos humanos’.
A governadora de Roraima, Suely Campos (PP-RR), tentou tirar ‘o dela’ da reta. Em novembro último, enviou um ofício ao ministro da Justiça e Cidadania, Alexandre de Moraes, pedindo ajuda federal em caráter de ‘urgência’, mas recebeu um não. Agora que a questão veio a público, o ministério se defendeu, ao alegar que não poderia atuar como administrador de presídios controlados pelo governo estadual, pois somente poderia agir em casos de rebeliões ou de insegurança pública. A solicitação da governadora, já prevendo um caos que foi negligenciado, se deveu ao enfrentamento entre presos do PCC e do Comando Vermelho (CV), em outubro passado, que resultou em pelo menos 10 mortos.
Estereótipo, generalização e indiferença
Ontem (6) o secretário Nacional da Juventude, Bruno Júlio, cujo órgão é ligado à presidência da República, pediu demissão do cargo, depois de ganhar seus 15 minutos de fama com uma declaração para lá de polêmica sobre os episódios em Manaus e em Boa Vista. Ao colunista Ilimar Franco, do jornal ‘O Globo’, falou que deveria haver uma chacina por semana. “Eu sou meio coxinha sobre isso. Sou filho de polícia, né? Tinha era que matar mais. Tinha que fazer uma chacina por semana”, expressou. Por um lado, ele justifica suas declarações por ser filho de policial, o que acaba criando um estereótipo aos agentes. Por outro, ele só disse o que muita gente gostaria de falar, mas não pode ou não tem coragem. Entretanto, ele generaliza que todo prisioneiro é bandido, o que parece uma estratégia de defesa – que não funcionou –, para minimizar a gravidade dos acontecimentos e uma eventual responsabilidade do governo federal. Os entes federativos que integram a segurança pública são culpados, sim, de modo geral, porque é um problema crônico de Estado que se arrasta por inúmeros governos incapazes de promover a ressocialização dos detentos, que podem sair piores do que quando entraram. A HRW lembrou que o narcotráfico recruta membros de dentro das cadeias e que muitos detentos acabam se associando, em busca de proteção para garantir a sobrevivência.
Aliás, é quase um consenso essa generalização, porque ninguém se comoveu ou se impressionou com as decapitações noticiadas em Manaus, como costuma ocorrer quando as vítimas são do Oriente Médio, por exemplo. Boa parte da população brasileira recebeu com indiferença a notícia. Somente para simpatizantes da esquerda cola a tese de que o bandido é uma suposta vítima da sociedade.
A questão aqui não é defender bandido nem julgá-lo, até porque isso é função do Judiciário, não da imprensa. É bom lembrar que 40% da população carcerária está em regime provisório, ou seja, aguardando julgamento. São pelo menos 250 mil. Isso segundo dados do Ministério da Justiça até abril de 2016. A morosidade do Judiciário pode responder essa indefinição. Contudo, são mantidos junto aos já condenados.
A título de curiosidade, o agora ex-secretário foi denunciado no ano passado por suposta agressão à ex-mulher, com direito a socos e chutes. E em 2015, também denunciado por uma ex-assessora, de que ele supostamente a assediava sexualmente, sob ameaça de demissão.
Entra por um ouvido, sai por outro
Em dezembro de 2015, quatro peritas do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT) – órgão criado em 2013 por legislação federal – visitaram presídios do Amazonas e fizeram recomendações ao governo estadual, inclusive para tentar diminuir a superlotação das celas. No Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj), onde 56 detentos foram assassinados esta semana, a capacidade então constatada era para 450 presos, mas abrigava 1.147. Elas criticaram: que o controle do local estivesse nas mãos da iniciativa privada, neste caso a empresa Umanizzare; a alta rotatividade de agentes, o que dificultaria a identificação de supostos agressores; e os baixos salários que poderiam tornar os agentes alvos fáceis de suborno por parte de prisioneiros. Os contratos com o governo estabeleciam 250 funcionários, mas só 153 atuavam lá. Quase 100 profissionais a menos do que o combinado.
A Pastoral Carcerária disse ter denunciado ‘reiteradas vezes’, desde 2015 pelo menos, supostas violações de direitos humanos contra os detentos em Roraima. Em 2014, a PAMC foi palco de outra rebelião e os internos reclamavam de supostos maus-tratos por parte de agentes penitenciários. Que fique claro que as recentes chacinas foram disputas e acertos de contas entre bandidos, e não um protesto pelas más condições do ambiente.
A má fama do sistema carcerário tupiniquim é tanta que, em 2014, por exemplo, a Justiça italiana questionou se as cadeias tinham condições para garantir ‘os direitos fundamentais da pessoa humana’ do ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato, condenado no esquema do Mensalão. Ele tinha fugido do país para não ser julgado pela Justiça daqui.
Durante uma palestra para 250 pessoas numa universidade no Reino Unido, em 2014, o então presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Joaquim Barbosa, classificou as penitenciárias do Brasil de ‘inferno’, e explicou que não há vontade política para melhorá-las, porque não trazem votos aos governantes.
A perguntas que não querem calar: será que haverá outro banho de sangue??? Em qual presídio??? Quando???
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