Terça-feira, 21 de março de 2017 PT quer CPI Embargo Imagem: Pixabay / Reprodução / Creative Commons Imagem ilustrativa O B...
Terça-feira, 21 de março de 2017
PT quer CPI
Embargo
Imagem: Pixabay / Reprodução / Creative Commons
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O Brasil começa a sentir na carne – não na pele –, e em breve nos bolsos, os efeitos danosos provocados pela operação Carne Fraca, deflagrada na última sexta-feira (17/3) pela Polícia Federal (PF), que investiga uma suposta quadrilha que adulterava com produtos químicos carnes em grandes frigoríficos com a conivência de alguns servidores do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). O produto tupiniquim já enfrenta barreiras no Chile, União Europeia, China, Hong Kong e Coreia do Sul, por exemplo.
Ontem (20) o Chile havia suspendido a importação da carne brasileira, mas não estava claro se a medida valeria somente para os 21 frigoríficos alvos da operação ou se para todos. Foi então que o ministro da Agricultura, Carlos Fuche, esclareceu que a decisão era generalizada e temporária.
“Estamos desde sábado analisando a situação que é conhecida a respeito da investigação que ocorre no Brasil por parte da chancelaria, para indagar delitos cometidos por alguns matadouros frigoríficos brasileiros de bovinos tanto ao consumo local quanto às exportações”, disse o representante do governo chileno.
Nas redes sociais, o Ministério da Agricultura chileno explica que a decisão visa proteger os consumidores. O órgão não deu importância à ameaça de retaliação a produtos chilenos feita pelo ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento do Brasil, Blairo Maggi.
A União Europeia suspendeu a compra de produtos das empresas investigadas e recomendou a seus 28 países associados maior fiscalização durante as inspeções das carnes brasileiras. O Ministério da Agricultura brasileiro suspendeu a licença de exportação dos 21 frigoríficos em questão.
A China pretende reter nos portos o produto brasileiro até estar convencida de que o mesmo é seguro. Hong Kong, região administrativa chinesa, também embargou a entrada de carnes brasileiras.
Já a Coreia do Sul, que tinha embargado a compra de frangos, mudou de ideia e suspendeu a restrição, depois que o governo brasileiro lhe informou que o país não adquiriu carne estragada.
Para a professora de Direito Internacional e Relações Internacionais e consultora em Comércio Exterior Blenda Lara, ao OPINÓLOGO, o governo brasileiro precisa dar transparência às investigações, para tentar suspender os embargos.
“Como perspectiva internacional entendo que o governo federal, por meio de sua diplomacia, já busca gerenciar os danos ocasionados pelo fato. É importante nesse momento a manutenção da transparência das ações de governo no sentido da responsabilização dos culpados pelos atos identificados pela Polícia Federal. Isso irá diluir o alarme tanto interno quanto internacional em relação ao produto e ao setor como um todo, o qual foi visivelmente atingido. Com os esclarecimentos, ao longo do tempo esses embargos tenderão a ser suspensos.
Houve casos semelhantes de contaminação em alimentos ou mau processamento dos mesmos em outros países, como no Japão e EUA, assim sendo, esse fato isolado que configura desvio de conduta de algumas pessoas da empresa e do governo poderia se dar em qualquer local. O importante é a descoberta e o ajustamento de conduta a ser feito pelas empresas envolvidas”, avaliou a especialista.
“Sabe quem vai ser punido? Vai ser o coitado daquele pecuarista que tem as suas vaquinhas lá e para quem a esperança de vende-las para poder sobreviver. A carne, com certeza, vai lá embaixo, não vai sobrar para pagar o capim que a vaca comeu”, observou o senador José Medeiros (PSD-MT).
CPI
O senador Paulo Paim (PT-RS – que é vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado (CDH) – pretende debater a operação junto a fiscais de vigilância sanitária, representantes do setor agropecuário, governo e Ministério Público. O tema poderá ser discutido já a partir da próxima terça-feira (28).
Já a bancada do Partido dos Trabalhadores (PT) na Câmara, que agora é oposição, informou que pretende colher assinaturas de deputados federais, para criar uma comissão parlamentar de inquérito (CPI), com o objetivo de discutir a operação Carne Fraca. O anúncio foi feito pelo líder da bancada na casa, deputado federal Carlos Zarattini (PT-SP).
“Em razão da gravidade das denúncias levantadas pela Operação Carne Fraca, deflagrada nesta sexta-feira (17) pela Polícia Federal, a Bancada do PT anuncia que, a partir de segunda-feira, começará a coleta de assinaturas para a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito”, disse o petista num trecho do comunicado.
“O Congresso Nacional deve contribuir com as investigações, já que as denúncias afetam diretamente os interesses do País. Em 2016, as exportações de carnes só perderam para a soja e os minerais, nos grandes grupos de commodities. O Brasil detém 40% do mercado mundial da carne de frango, 20% do mercado mundial de carne bovina e 9% do de carne suína.
As denúncias devem ser apuradas com rigor, para evitar danos à imagem do Brasil no exterior e a nossas exportações.
A CPI complementará as investigações, incluindo apuração rigorosa do esquema de propinas com envolvimento de funcionários do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e das denúncias de que o atual ministro da Justiça, Osmar Serraglio (PMDB-PR), teria ligações com um dos participantes das irregularidades”, justificou Zarattini.
Na verdade, o Brasil responde por 7,5% do mercado global de bovinos. Em 2015, por exemplo, respondia por menos de 5% do mercado mundial de suínos, ficando como o quarto ou quinto maior produtor.
Na verdade, o Brasil responde por 7,5% do mercado global de bovinos. Em 2015, por exemplo, respondia por menos de 5% do mercado mundial de suínos, ficando como o quarto ou quinto maior produtor.
Apesar de que o suposto objetivo de uma CPI seja apurar os fatos, na prática não resolve absolutamente nada e serve de instrumento para fazer pressão política. Colocaria em evidência o escândalo e fomentaria uma crise no governo do presidente Michel Temer (PMDB-SP), quem tenta apagar o ‘incêndio’ provocado pelo suposto alarmismo da ação policial e que já traz consequências imediatas negativas para a economia, justo no momento que o país parece dar os primeiros sinais de recuperação.
O governo federal vem tentando minimizar as denúncias e garantir a qualidade do produto brasileiro, principalmente no mercado internacional, mas esquece que o principal consumidor é o próprio brasileiro. Portanto, convencer ao mercado interno sobre a credibilidade do produto feito aqui poderia influenciar o mercado externo. O presidente Michel Temer (PMDB-SP) preferiu não criticar a operação e destacou que dos 4.837 frigoríficos existentes no país, somente 21 são citados e/ou investigados. Três deles foram interditados pelo Mapa e só poderão voltar a funcionar, após comprovarem condições sanitárias para isso. Temer também apontou que dos mais de 11 mil servidores da pasta, apenas 33 estariam envolvidos, os quais já foram exonerados dos cargos. A denúncia foi feita por um dos fiscais em 2014.
As empresas JBS (dona de marcas como Seara e Friboi) e a BRF Brasil Foods (dona das marcas Sadia e Perdigão), por exemplo, investiram em anúncios no Google AdWords, serviço de publicidade do Google. Quando um internauta faz buscas sobre a operação Carne Fraca, o buscador mostra um link para o comunicado das duas empresas, as maiores do setor no país, em que elas reforçam para a qualidade de seus produtos e os rigorosos sistemas sanitário e de fiscalização por parte autoridades brasileiras e estrangeiras. A primeira, por exemplo, busca levar mensagem a seus clientes também com anúncios na TV e no YouTube. Já a segunda não se vê mais publicidade, depois que uma de suas unidades de produção, em Mineiros (GO), foi interditada pelo Mapa.
O agronegócio é uma espécie de patrimônio nacional, motivo de orgulho. O país está entre os maiores exportadores de bovinos e aves do mundo. No ano passado, por exemplo, gerou 19 milhões de postos de trabalhos, cerca de 20% do total de empregos no país, segundo o portal ‘G1’. Outrossim, é que o setor é responsável por 22% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro.
Apesar de o agronegócio ser vital para a economia brasileira, note-se também que alguns desses grandes frigoríficos são grandes financiadores de campanha eleitoral, o que talvez justifique tanto afinco em sua defesa por parte de políticos críticos à operação, como também alguns destes são empresários do ramo.
Críticas
A PF ainda não se manifestou publicamente sobre as críticas que tem recebido por associações do agronegócio, políticos e também do ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Blairo Maggi. Este, por exemplo, criticou a ‘narrativa’ como os fatos vieram a público e o suposto desconhecimento técnico de algumas normas e regulamentações sanitárias por parte dos investigadores. O ministro disse não acreditar que houvesse papelão misturado às carnes, e sim que num grampo telefônico feito pela corporação, dois dos investigados falavam a respeito da embalagem dos produtos.
“Eu acho que essa questão [do papelão] é muito mais da forma como foi comunicada, a narrativa como foi feita. Eu não posso ter controle como as pessoas se expressam. Por exemplo, essa questão do papelão está claro no áudio, e está lá colocado, que estão se falando de embalagens, e não falando de misturar papelão nas carnes, então seria uma idiotice, uma sanidade para dizer a verdade, porque as empresas brasileiras investiram alguns milhões e milhões e milhões de dólares nos seus mercados, conquistar mercados, é mais de 10 anos para você consolidar um mercado, aí você pega uma empresa que é exportadora e vai misturar papelão na carne? Pelo amor de Deus, não dá pra aceitar esse tipo de situação. Então, a narrativa nos leva a criar até fantasias. A partir de uma fala, as redes sociais, a mídia começa, cada uma fala de uma maneira e isso vai criando uma expectativa diferente”, opinou Maggi.
Para o pecuarista e vice-presidente da Sociedade Rural Brasileira (SRB), Pedro Camargo Neto, a PF foi ‘irresponsável’, ao anunciar a operação Carne Fraca como ‘a maior da sua história’. A entidade pede que a corporação apresente os resultados da investigação, para que os fatos sejam elucidados o mais breve possível.
“Eu acho que, na verdade, carne fraca deve ter o delegado responsável por essa operação, pela irresponsabilidade. A carne fraca deve ser a dele, pela necessidade de aparecer nos holofotes e colocar a principal matriz da nossa economia brasileira na situação de vexame em que se encontra hoje perante o Brasil e perante o mundo”, manifestou o senador Cidinho Santos (PR-MT).
Em nota divulgada no último sábado (18), a Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne (Abiec) informou que nenhum dos seus 29 associados foram citados no escândalo e que este seria um fato isolado. Também ressaltou que o Brasil é o maior exportador de carne bovina do mundo e que o país é reconhecido pela qualidade das mercadorias e seu elevado padrão sanitário.
Em nota divulgada no último sábado (18), a Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne (Abiec) informou que nenhum dos seus 29 associados foram citados no escândalo e que este seria um fato isolado. Também ressaltou que o Brasil é o maior exportador de carne bovina do mundo e que o país é reconhecido pela qualidade das mercadorias e seu elevado padrão sanitário.
Ainda é cedo para dizer se a PF foi midiática ou não. No entanto, as críticas que vem recebendo, inclusive da imprensa, que poderiam caracterizar suposta pressão, não podem nem devem intimidá-la a cumprir com seu trabalho. Observa-se uma suposta tentativa de demonizar a instituição e tangenciar a responsabilidade para o denunciante, em vez dos denunciados. Busca-se inverter o efeito pela causa. A Polícia Federal tem até esta terça-feira (21) para entregar à Justiça os demais laudos dos produtos analisados das empresas investigadas.
A operação Carne Fraca denota que a mente também é fraca e não pode se restringir à suposta e simples adulteração de carne podre. O suposto esquema, além de colocar em risco a saúde pública, aponta para participação de agentes públicos e que entre os beneficiários estariam dois partidos políticos, um deles o que governa o país, o que torna mais grave a questão.
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